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Notícia

Tarifas com CNPJ: o protecionismo que o Brasil finge não ver

Enquanto país condena tarifas impostas pelos EUA, aplica suas próprias barreiras internas contra empresas, especialmente na saúde

A recente decisão do governo norte-americano de impor tarifas sobre produtos brasileiros, com base na Seção 301 do Trade Act, foi recebida em Brasília com indignação e discursos em defesa do livre comércio. O governo brasileiro, apesar de sinalizar que não retaliaria, foi enfático ao qualificar as tarifas como injustas, unilaterais e prejudiciais ao investimento e à previsibilidade das relações econômicas.

A retórica é conhecida. O problema é que, ao mesmo tempo em que o Brasil condena o protecionismo alheio, aplica o seu próprio, só que com CNPJ e em nome de pseudo “interesse nacional”.

Nos últimos anos, o protecionismo brasileiro se sofisticou. Abandonou as tarifas clássicas e passou a operar por meio de preferências administrativas, normas técnicas, filtros opacos e critérios de priorização tecnológica. O caso mais evidente está no setor da saúde, especialmente nas políticas de compras públicas e aprovações regulatórias.

No apagar das luzes de julho de 2025, por exemplo, a Resolução CIIA-PAC/CC nº 3/2025, publicada pelo MDIC, reforçou a diretriz de priorização de tecnologias de fabricação nacional nos processos de compra com recursos públicos. Ao mesmo tempo, o Ministério da Saúde passou a exigir, em diversas frentes, a comprovação de “conteúdo local” como critério de avaliação.

Na prática, empresas legalmente brasileiras, com sede e operação no país, vêm sendo excluídas de políticas públicas apenas por terem estrutura societária vinculada a grupos internacionais. Mesmo quando produzem localmente, geram empregos, recolhem tributos e cumprem rigorosamente a legislação, seu “capital estrangeiro” tem pesado contra elas.

O paradoxo se torna ainda mais evidente diante da crise sanitária enfrentada pelo Brasil, como no caso da dengue. Tecnologias geneticamente modificadas, armadilhas inteligentes, sistemas de monitoramento vetorial e outras inovações desenvolvidas por empresas brasileiras com atuação internacional têm enfrentado resistências implícitas no processo de avaliação, priorização e incorporação pelo setor público. O mesmo pode ser aplicado ao ambiente dos equipamentos, insumos e tecnologia médico-hospitalares.

Mesmo quando autorizadas pela autoridade competente, a ampliação do acesso às tecnologias é frequentemente preterida em favor de soluções “nacionais”, ainda que menos eficazes, mais caras ou menos escaláveis. Esse tipo de preferência, que aparentemente promove soberania tecnológica, limita o acesso da população a soluções eficazes e afasta investimentos de longo prazo. E faz isso sem debate público, sem análise de impacto regulatório e sem considerar os reais critérios de custo-efetividade.

A crítica às tarifas dos EUA parte de um argumento legítimo, já que medidas unilaterais e discriminatórias desequilibram mercados e penalizam parceiros comerciais. Mas perde força quando o país que se apresenta como vítima pratica discriminação equivalente contra empresas estabelecidas em seu próprio território.

Empresas instaladas e operantes no Brasil são brasileiras, especialmente se aqui contratam, pagam impostos aqui e se sujeitam à regulação local. A origem do capital não pode se tornar critério ilegítimo de exclusão em políticas públicas.

O protecionismo seletivo, mesmo que disfarçado de política industrial, impõe custos significativos ao país ao afugentar investimentos estruturantes; desestimular parcerias tecnológicas internacionais; dificultar a ampliação do acesso da população a tecnologias inovadoras. Ainda, fragiliza a posição brasileira em disputas internacionais, inclusive em painéis comerciais nos quais o país pretende se apresentar como defensor do livre comércio.

É possível e desejável adotar políticas de estímulo à produção local, conteúdo nacional e desenvolvimento de tecnologia própria. Mas isso deve ser feito com regras claras, previsibilidade jurídica e respeito à igualdade de tratamento entre empresas legalmente estabelecidas.

O que o Brasil precisa evitar é o duplo padrão ao denunciar o protecionismo quando vem de fora, mas tolerá-lo quando vem travestido de política pública nacional.

Se o país quiser ser ouvido em foros multilaterais, respeitado por investidores e eficaz na defesa do acesso à saúde, precisa começar reconhecendo que tarifas com outro nome continuam sendo tarifas. E, no setor da saúde, elas custam mais do que dinheiro: custam tempo, acesso e, potencialmente, vidas.